Supostos netos podem ajuizar ação de reconhecimento de parentesco e pedido de herança contra o avô já falecido
Em decisão inédita, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça decidiu que netos têm o direito de ingressar com ação declaratória de reconhecimento de relação avoenga (parentesco entre avôs e netos), para os fins de serem reconhecidos como descendentes deste e participar de sua herança.
O caso em comento é peculiar e inovador pelo fato de, até então, o direito de investigação de ascendência ser considerado personalíssimo, ou seja, somente o pretenso filho teria o direito de postular o reconhecimento judicial da paternidade, e por conseqüência, o direito de herança.
Em face deste entendimento, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que apreciou a questão, havia julgado extinto o processo sem julgamento de mérito, apontando serem os pretensos netos carecedores do direito de demandar o reconhecimento da ascendência contra o avô já falecido, pois tal direito seria personalíssimo do pai destes, que também já havia falecido.
Ocorreu que o pai dos peticionários jamais ajuizou ação de reconhecimento de paternidade contra seu suposto genitor. E os peticionários ajuizaram o pedido de reconhecimento somente após o falecimento do suposto avô.
Em que pese o falecimento de ambos, o Superior Tribunal de Justiça entendeu que, na linha reta, é possível demandar pelo reconhecimento do parentesco ascendente de forma infinita, mesmo que, inclusive, o ancestral de quem se busca o reconhecimento, tenha perecido.
A relatora do processo, ministra Nancy Andrighi, destaca as razões para a mudança de entendimento da Corte a respeito da matéria: “Sob a ótica da moderna concepção do direito de família, não se mostra adequado recusar aos netos o direito de buscarem, por meio de ação declaratória, a origem desconhecida”.
E continua:Se o pai não propôs ação investigatória em vida, a via do processo encontra-se aberta aos seus filhos, a possibilitar o reconhecimento da relação de parentesco pleiteada. Dessa forma, os netos, assim como os filhos, possuem direito de agir, próprio e personalíssimo, de pleitear declaratória de parentesco em face do avô, ou dos herdeiros, quando o avô for falecido.”
Em decorrência do reconhecimento do direito dos netos de demandar o reconhecimento de parentesco contra o avô falecido, o processo retornará à vara de origem e seguirá seu curso, podendo vir a ser realizado exame de DNA, mediante exumação nos restos mortais dos falecidos pai e avô dos autores da ação, para a comprovação técnica da ascendência.
Se o parentesco biológico entre netos e avô realmente existe, somente a perícia técnica poderá dizer, todavia, o direito destes de buscar tal reconhecimento, por óbvio, não pode ser obstaculizado.
O julgamento em destaque demonstra que, pelo menos neste caso em particular, o Superior Tribunal de Justiça, a despeito de estar atrelado a diversos requisitos de formalidade, buscou exercer com relevância sua real missão constitucional: conceder a prestação jurisdicional ao cidadão de forma efetiva e justa.